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sábado, 8 de abril de 2017

Como Esquecer?

O Tempo.

Há muita gente que passa a vida se preocupando com ele. Não, muita gente não... Todo mundo, pelo menos uma vez na vida. Pra ser sincero, uma vez a cada dia. Bom, acho melhor dizer “uma vez a cada segundo” – ou diria milésimo? Ah, tanto faz, tudo é tempo e a todo tempo nos preocupamos com o tempo, porque pensamos estar sem... Tempo. E usamos tempo pra fazer isso.

Confuso, não?

Pense nos relógios. Solar, de bolso, de pulso, de beira-estrada com publicidade em cima, de rádio, de celular. Pense na falta que eles fariam caso todos nos abandonassem ignorantes ao nosso próprio tempo. Pois é, um caos. Porque não é difícil pensar em pelo menos milhares de milhões de ocasiões onde ter um relógio ao alcance é uma verdadeira bênção, pra nos situar em qual trecho estamos nessa estrada feroz chamada existência. E quem pode lutar contra esta preocupação instintiva? Vai ver, é ela quem tem mantido nossa espécie viva – o que por si só já é bastante tempo.

Mas há momentos, na vida, em que o tempo é... O tempo é nada. É irrelevante, como uma partícula de poeira numa estante que acabou de ser limpa. Ela está lá, porém não nos alcança. Neste instante, “ser abandonado” por todos os relógios é favor; não maldição. Sim, estou sendo contraditório, pois é assim que enganamos o tempo.

E no canto daquele lugar nos sentimos assim: senhores; minha cúmplice e eu, banhados pela luz fluorescente e cercados pela doçura da nossa longa conversa. Bem ali, naquele cantinho. Éramos, ali, senhores do tempo. E para tal feito não houve necessidade em derrotá-lo e fazê-lo refém. Bastou ignorá-lo, depositando toda a nossa atenção em coisas muito mais importantes do que ele. Os olhos que se olham; as palavras que se ouvem; os toques que se tocam; a privacidade que é conveniente; os desejos que não se convergem. Tudo feito com a paciência de quem – olha só que irônico! – faz um relógio.

Aquele momento, aquele lugar... Aquele canto estava imune ao tempo. Não havia pressa, senão para conhecer ainda mais um ao outro.

- Quando eu era criança, eu fazia... – ela começou a dizer.

- É verdade? Eu também. Bem, só com a diferença que eu já...

- Jura? Eu também! Adorava fazer isso.

- Mentira. Pensei que eu era o único no mundo.

- Tá pensando o quê, rapaz, eu era mestre nisso.

- Uau.

- Que coincidência bizarra, não é?

- É – ri abobalhado. – Muita.

Depois vinham as questões mais sérias:

- Foi um momento muito difícil, eu ficava triste e... – Dizia ela com a voz salpicada de choro, ou algo próximo disso.

- Eu posso imaginar. Sinto muito.

- Já passou.

- O que mais aconteceu?

- Aconteceu que certo dia tudo piorou de novo e...

- Caramba. Passei por um problema parecido com esse, sabia?

- É mesmo? Como você se sentia?

- Mal, né? Ainda mais porque a solidão...

- Exatamente. Eu sinto muito.

A cada palavra, a cada sílaba, a cada morfema trocado, nós dois mergulhávamos mais fundo um no outro. Quando a profundidade alcançou a distância considerável, fomos capazes de enxergar nossos pensamentos. E não foi nenhuma surpresa ver nossos rostos projetados neles. Mesmo assim continuávamos cautelosos, mergulhando mais, rumo ao centro produtor de todo o sentimento que borbulhava em cada gesto e olhar.

Deveríamos estar em outro lugar, mas parecia que nada mais existia – e de fato não existia. Os corações foram encontrados no fim do mergulho, pulsantes e em cor viva, liberando todas as borboletinhas que voavam para o estômago. Que lugar perfeito para se apaixonar! Seu olhar, quando me acariciou, fez-me embaralhar as peças da minha vida – e o jogo mal havia começado. Sorri diante da sorte de ser olhado por aquele olhar, entendendo o que tudo aquilo significava.

Minha mão agora tinha o seu cheiro, pois ela corria, leve como uma pena, pela face lisa e delicada. As retinas dilataram-se diante da força do desejo e o sangue contaminara-se pela ansiedade que transitava sem freio. “Sorte nossa estarmos sentados”. No entanto, se olhássemos com a atenção devida, constataríamos que estávamos voando, mais perto de estrelas do que de nuvens. Frenéticos e imóveis, nossos corpos alinharam-se. Impressionante como uma conversa pode mudar a sua vida. A minha estava mudando e mudando diante de mim.

O autocontrole até aqui vigente possuía seus motivos para existir, só que tal como todo o resto, eles tornaram-se nulos também. E foi assim que o tronco dela cedeu em minha direção. A árvore que eu desejava ter sobre mim finalmente veio. Os lábios tocaram-se, torceram-se, molharam-se. As línguas chuparam-se e salivaram uma sobre a outra, transmitindo informações que não se acha em palavras. Aguentei firme a dose graças ao sutil apoiar das mãos, uma no meu peitoral e a outra sobre a minha perna. Pude sentir seus seios acolchoarem-me no tórax quando avancei num ataque de paixão. As curvas foram contornadas pelas minhas mãos e tomei a liberdade de apertá-las, como se fosse possível fundirmo-nos.

Dançávamos como dois apaixonados. Era como se agora vivêssemos dentro de nós mesmos, num universo paralelo e só nosso.  Não me pergunte quanto tempo durou. Na hora queríamos que fosse infinito. Mas não foi. Minha boca fora levemente mordida pelos seus dentes perfeitos. Ainda estava me acostumando com os nossos beijos – estávamos ficando bons nisso, aliás.

Passado o ápice, os braços compuseram um abraço quente e cheiroso. Cabelo fazendo cócegas, respiração úmida rente aos ombros, um silêncio solene e cheio de significados... Parece loucura, mas eu me senti completo ali, naquele cantinho. Entre um suspiro e um selinho no meu ombro, eu pude ouvir um...

- Eu te amo.

Veio assim, do nada. Eu nem vi chegando. E, quando chegou, eu pensei que estava sonhando. Não tive chance para me preparar. A verdade é que ela tinha sido mais corajosa do que eu para dizer aquelas três palavras. Minha primeira reação foi ficar atônito, desnorteado; ninguém nunca dissera isso para mim. Eu queria beijá-la, tê-la, olhá-la, tocá-la, abraçá-la, carregá-la, tudo ao mesmo tempo, até que compreendesse que o Amor era recíproco. Eu realmente pensei estar sonhando.

O abraço foi aos poucos se desfazendo e dando lugar a um fitar de olhos apaixonados. Jamais voltaríamos a ser aquelas crianças que falávamos que éramos. Pensávamos em como seria maravilhoso termos nos conhecido antes. Contudo, a vida tem as suas ironias e contradições que são mistérios insolúveis. Mas eu realmente achei estar sonhando. Sonhando um sonho junto a ela, a árvore do meu habitat. Graças a Deus tudo era real.

quarta-feira, 27 de julho de 2016

Zero seis do zero sete


Hoje é um dia especial - pelos menos é assim que se denomina o dia do nosso aniversário, não é mesmo? Porém, acima de tudo, é um dia, mais um, e eu estou aqui, vivo. E é interessante pensar o quanto estamos expostos a qualquer sorte de experiência, boa ou ruim, exatamente por causa desta condição, por causa deste verbo: viver. Sou grato por isso, sou grato por poder envelhecer. Mais uma translação foi completada e uma nova primavera tá aí, fazendo com que todos os aspectos do último inverno virem lembranças, até que se percam na implacável neblina do tempo. Mas a real é que eu não quero esquecer. Eu quero levar comigo alguma coisa que me faça lembrar, nem que seja só aquele galho ali, sem nenhuma folha. Eu quero entrar na nova estação tendo equilíbrio entre as distinções que formam o todo, carregando tudo em igual medida, para que eu lembre de onde vim, para onde vou, por quem eu vou e para quê eu vou.

Portanto, neste dia especial agradeço a Deus por mais um ano de vida, muito obrigado mesmo. Agradeço a minha família, minha primeira e mais importante base. Agradeço aos meus amigos pelo carinho, amor e, sobretudo, paciência. Eu sou grato, eternamente. Para este aniversário eu peço além de saúde, felicidade, paz... eu peço perdão. O erro é inerente a mim e a ideia de ter ferido um coração é dolorosa demais para que eu continue sem pedir isso hoje e todos os dias, o perdão de Deus e o seu, o de todos vocês. Perdoem-me.

Quando criança, eu sempre torcia para que nada de errado ocorresse no mundo no dia do meu aniversário, que ninguém morresse, ninguém brigasse, ninguém chorasse, enfim, que tudo parecesse perfeito aos meus olhos - coisa de criança. Os pesos dos anos foram destroçando minha inocência, mas mesmo assim eu vou lhe desejar este tipo de dia para você, exatamente este tipo de dia absurdamente ingênuo e apetitoso, pois eu amo vocês e isso nenhum dia "chato" irá mudar.

É, 23 parece um ótimo número pra mim.

No momento, é o melhor número que eu poderia ter.

Obrigado e feliz aniversário pra mim.

sábado, 28 de maio de 2016

O Paradoxo

Ela e ele estavam no fim corredor. Bem, talvez não fosse o fim exatamente, levando em conta a figura de uma escada sob uma débil iluminação, situada logo além deles. Aquilo muito bem poderia ser o começo do corredor, aquilo muito bem poderia ser eles, dentro daquela escuridão conveniente e longe dos olhares dos quais fugiam. Na prática, essa ideia não havia passado na cabeça dele, ela, porém, achou que sim, então ele passou a achar que sim, ele quis que sim, quis que ocorresse. Mesmo contra a vontade unânime de seus corações, eles escolheram o fim ao invés do começo, e portanto pararam em uma porta. Por simplesmente ser quase impossível fazer o que ansiavam, escolheram a luz.

O percurso até lá, em si, nascera encharcado de cautela e preocupações, já que ele tinha diversos significados, especialmente os ligados ao desejo de fuga. Muito mal sabiam eles que a liberdade jamais brilharia de forma habitual, e com o preço habitual. Estavam aprisionados e para sempre seria assim. Foi por isso que, como em todas as outras vezes, pararam naquela porta e não foram além, pois além havia a escada, a escuridão e a excitação, e as correntes não permitiam tal banquete. Entretanto, apesar de todo o cuidado, os olhares julgadores ainda corriam eufóricos ao derredor, invisíveis e astutos. Ela tentava pegá-los, pelo simples prazer de ser capaz de percebê-los e prová-los errados; Ele, por outro lado, os ignorava, não porque era a melhor opção, mas porque era a menos dolorosa. 

Sim, ela e ele estavam no fim do corredor. Sim, ela e ele pararam onde poderiam ser vistos, pararam em uma porta. Pela sorte de olhos não serem capazes de ouvir, eles agora tinham privacidade, por menor que fosse, para conversarem sobre os infinitos obstáculos que os impedem de obter um contato mais genuíno. Obstáculos, esses, que são capazes de se materializar em qualquer coisa, até mesmo em uma porta. Sim, eu disse que ela e ele haviam parado em uma porta, não disse? Porém, mais parecia que tinha sido a porta que escolhera parar ali, justamente entre os dois. A dura verdade é que aquela porta sempre esteve lá, muito antes deles desconfiarem da existência um do outro, quiçá antes mesmo de ambos terem nascido. Mas se torna divertido, por vezes, pensarmos nesse tipo de simbolismo: No meio do caminho tinha uma porta, tinha uma porta no meio do caminho - e antes fosse só uma pedra. Eles não percebiam o que aquela porta representava no momento, provavelmente distraídos pela insistente procura por respostas que explicassem toda a situação, um esforço quase inútil. Dúvidas mais nasciam do que morriam e, durante esse ciclo, sem o querer das partes envolvidas, a porta ia se expandindo entre eles. Dentro da abertura existia uma força física que empurrava de volta ao lugar adequado aquele que tentasse ignorar as regras, desconsiderar as dificuldades. A força tinha diferentes faces, a face de uma proibição, uma culpa, uma vida antecedente; a face de um medo, um princípio, um eclipse. Para uma pessoa comum, era apenas uma porta com uma sala vazia, para eles, não. Era um tudo vestido de nada, assim como um começo vestido de fim.

Tão perto e tão longe, eles conversaram, cumprindo o rotineiro parto de dúvidas. Mas a angústia valia a pena, porque apreciavam a companhia um do outro. Trata-se de uma história triste, muito triste, mas também valia a pena, porque apreciavam o olhar e o sorriso um do outro. Os pensamentos são sempre mais rápidos que as palavras. Eles sempre atropelam tudo, inclusive as diversas faces de uma força inibidora. Embora exista o partir dos corações, tais momentos servem para tentar remendá-los, enquanto continuam a quebrarem-se, selando um completo paradoxo. 

O tempo voou na velocidade dos pensamentos e, quando ela e ele deram por si, já era tempo de ir. A porta cumpriu sua função com sucesso. Ainda restava muito o que dizer e fazer. Mas para quê, afinal? Eles bem conheciam a gravidade de suas ações concretas e hipotéticas. Além do mais, algumas poucas coisas merecem o campo do subentendido para que haja certa magia. Logo, conforme foram se afastando da porta, a mesma retornava ao seu aspecto anterior, o de simplesmente ser uma fenda em uma parede, nada mais. Os olhares aquietaram-se e retomaram o humor padrão. A luz que se ausentara da escada por todo aquele intervalo de tempo, voltou a resplandecer os degraus. Parecia que não, mas tudo estava recobrando a normalidade. Eles chegaram ali juntos. Eles foram embora separados. Não podiam bobear, com certeza a essência do obstáculo deixou aquela porta para poder possuir qualquer outra coisa.

A questão é quanto mais ela e ele se afastam, mais eles se atraem. Essa, aliás, é a parte mais triste deles. A parte da divisão do coração com a contradição dos atos. Quem sabe um dia alguém explique isso... Explique ela e ele.